Apresentação do zine Corpo que está, por Daniele Queiroz
- tiagojonas9
- 29 de jun.
- 2 min de leitura

Audre Lorde defendia o erotismo como um modo de estar no mundo, uma forma de viver. Não aquele erotismo – ou pornografia, como ela dizia – deformado pela publicidade, pelo consumo e pelo olhar empobrecido para os corpos, mas sim o erotismo como potência de vida. A sensibilidade e a sensualidade como ferramentas de encontro e desfrute de si, do mundo e do outro.
É a partir dessa noção ampliada de erotismo que encontramos o trabalho de Sofia Colucci. A artista parte da investigação do corpo humano em seus contornos, formas e possibilidades de representação. Ao trabalhar fotograficamente o corpo nu, referencia e subverte uma importante tradição na história da arte – aqui é a mulher que possui a câmera – e, ao mesmo tempo, cria relações de intimidade e confiança com os retratados, sujeitos ativos na construção conjunta da narrativa.
Chave fundamental em seu trabalho é a sentença “Corpo que está”, título deste zine. A impermanência é evocada nos corpos que nunca são os mesmos, em uma fluidez que faz par com a água, elemento bastante utilizado nas imagens. Eles deslizam com e nas águas, flutuam e submergem, criam efemeridades. Em certo momento, quase deixam de ser corpos e se assumem como pura forma, dançam com as sombras, com as linhas de força da imagem, transmutam-se e criam estranhezas.
Ao mesmo tempo, vemos corpos que se camuflam, em um mimetismo proposital. Curvas viram pedras, o corpo-solo é parte do território. O jogo de luz e sombra confunde o olhar, os corpos são de alguma forma devolvidos à natureza, lugar a qual parecem realmente pertencer no trabalho da artista. O nu, visto pelos olhos de Colucci, busca uma maneira própria de existir, entre movimento e fluidez.
Transformar-se em pedra, em sombra, em água, fugir da velha noção estética (e estática). Desistir do antigo belo e criar outras rotas de beleza. Lembrar que um mesmo corpo nunca entra duas vezes no mesmo rio.
Erotizar o olhar e o mundo.
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